December 15, 2007

Trio de Azes

As Sugababes sempre se desviaram do conceito de banda pré-fabricada – são uma girls band, sim, mas evitando tudo o que de pejorativo isso tem.
O novo disco, Change, regista no título a saída de Mutya Buena e consequente entrada de Berrabah para o trio multi-racial. E, apesar das mudanças, voltam a mostrar que conseguem desmontar os clichés da pop e torná-los qualquer coisa diferente, longe dos chavões de Britneys, Aguileras ou Simpsons. About you now é uma lição de como escrever um grande single, Never gonna dance again torna-se uma grande canção R&B com algo mais do que apenas um amor perdido e Surprise vence com um refrão que é pura sacarose.
Guilty pleasure ou não, estas meninas podem mais que as outras.

December 14, 2007

Aristocrata folk

Josh Ritter tem vindo, ao longo da sua carreira, a gerar uma consensual aclamação da crítica internacional o que, para quem o conheça, não é de admirar. The Historical Conquests vem confirmar tudo o que já foi dito sobre ele – que, mais do que um bom singer-songwriter, é um excelente singer e um ainda maior songwriter. Mais uma vez, a folk é tratada como realeza, arredondada e sem pontas soltas, decorada com um bom gosto inegável. “Am I singing the right blues?” pergunta ele em Rumors. Respondemos nós: “Estás sim Josh, como ninguém”.
Post Scriptum: atenção à faixa quatro, The Temptation of Adam, candidata séria a melhor canção esquecida de 2007 e de elementar audição para românticos incuráveis.

December 13, 2007

Luzes em tempos natalícios

Ainda Easy Tiger não perdeu o “gosto” a novo e já Ryan Adams volta à carga, como que teimando na confirmação da sua (re)conhecida hiper-produtividade criativa: escassos 4 meses medeiam entre o supracitado longa-duração e este Follow the Lights, EP no qual continua a fazer-se acompanhar – e bem – pelos The Cardinals.

Com sete músicas no total e ocupando pouco mais de 30 minutos, este EP pode dividir-se em duas partes distintas: as três primeiras sendo novas composições de Ryan Adams, e as quatro últimas constituindo versões, das quais uma de “Down in a Hole” dos Alice in Chains e as restantes de músicas do próprio cantor constantes em álbuns anteriores.

O início do EP não desilude, com duas das três novas canções a cumprirem de forma bastante satisfatória e a remanescente a atrair atenções. Sem dúvida alguma, “My Love for you is real” apresenta-nos um Ryan Adams à altura dos seus pergaminhos, tanto a nível lírico como musical, e com uma capacidade notável de gerir eficazmente as oscilações ao longo da música de modo a criar um excelente resultado final.

No entanto, e curiosamente, acaba por ser a segunda parte aquela que mais surpreende. Nenhuma das reinterpretações deixa os créditos dos respectivos originais por mãos alheias, mas o maior destaque acaba mesmo por ir para a versão de “This is it” com os The Cardinals – infinitamente mais conseguida do que aquela presente em Rock n Roll. “If I am a Stranger” marca presença numa interpretação interessante e bem mais calma do que em Cold Roses, e para o final fica guardada “Dear John”, desta vez sem a presença de Norah Jones como em Jacksonville City Nights mas não menos eficaz por isso.

December 11, 2007

Dúvida (interlúdio)

Todos aqueles que vêm parar a este blog vindos de uma pesquisa no google sobre "pop neve" ou "pop natal" estão à procura exactamente do quê? Não consigo perceber...

December 03, 2007

A nova festa

Fantastic Playroom, assim se chama o disco de estreia dos New Young Pony Club, que já vinham construindo considerável “hype” ainda antes do lançamento do álbum muito por culpa de viciantes singles como “Ice Cream”, “The Bomb” ou “Get Lucky”. Não, para variar estes não vêm da Suécia, vêm de Londres. E sim, desta vez (ao contrário da grande maioria das vezes no que toca a bandas britânicas), o “hype” até tem razão de existir.

Disco coerente e conciso, onde o electro impera e dançar é palavra de ordem, ainda que apresente aqui e ali alguns devaneios, sejam eles rítmicos – no caso de “Hiding on the Staircase” – ou mesmo melódicos – como a mais calma (uma vez que balada é palavra proibida num disco que se quer de festa) “Talking, talking”. Vale a pena mencionar também, para além dos três supracitados singles, “The Get Go”, que tem sido aposta regular na Radar recentemente.

Disco que cumpre, e bem, o seu propósito: música para ouvir descomprometidamente e contagiar o corpo à dança, um pouco à imagem daquilo que fazem as Cansei de Ser Sexy. Não vai ficar para a história, mas também não era isso que lhes pedíamos – e de certeza que também não era isso que eles estavam à procura.

November 27, 2007

O Josh é bom companheiro

Ontem na Aula Magna tivemos direito a um Josh Rouse infelizmente doente, e em clara gestão de esforço. Foi o menos bom dos seus três concertos em Lisboa, ainda que o público tenha estado melhor que da vez anterior nesta mesma Aula Magna - de certeza que ajuda o facto de desta feita a sala ter estado a cerca de 85% da capacidade máxima.

Ainda assim o concerto teve os seus momentos (todas as de 1972, "Streetlights", "It Looks Like Love", "Feeling No Pain" ou "Caroliña", por exemplo). E, quanto mais não fosse, serviu também para pôr as mãos em Country Mouse Companion, EP de "takeouts" de algumas músicas presentes nos dois anteriores álbuns do cantor, bem como algumas raridades.

Aqui se confirma uma certa "recuperação" da boa forma da veia compositora de Josh Rouse, tanto nas novas músicas como nas diferentes versões de outras já editadas: apresentam-se, no geral, com arranjos mais minimalistas, menos trabalhados, e no entanto mais melódicos e que acabam por funcionar de forma bastante satisfatória.

Das primeiras audições ficou no ouvido principalmente a fantástica "Kuzbass", cujo ambiente mais melancólico e introspectivo proporcionado pelo violino a acompanhar a voz e guitarra acústica de Josh Rouse acaba por funcionar em pleno nesta altura mais fria do ano. A nova versão de "It Looks Like Love" e o instrumental "Snowfall" merecem também uma referência num EP que se distingue principalmente pelo seu equilíbrio como um todo, e que parece querer ilustrar (por oposição aos últimos trabalhos do cantor) o Inverno segundo Josh Rouse.

November 22, 2007

Ecos de Terras do Tio Sam

Após quase três semanas divididas entre Chicago e NY (e 25 CDs depois), o regresso à Pátria Lusa.

A primeira coisa que merece referência é a diferença de preços entre os CDs aí comprados e os que são praticados em qualquer loja neste cantinho à beira-mar plantado: o máximo pago foi de 15 $, que actualmente corresponde a uns meros 10 €, e apenas porque se tratava de uma Virgin MegaStore e de álbuns muito recentes, tal como “Magic” do Boss ou “Chase This Light”, o último trabalho dos Jimmy Eat World.

A segunda menção vai para a Tower Records: lojas em NY “viste-as”. Aquelas que sabia onde ficavam fecharam, e ninguém soube dizer onde eram ou sequer se exisitam actualmente...

E finalmente, uma nota de profundo desagrado para a mudança de mãos dos cinemas no Alvaláxia, da Millenium para a Lusomundo. Mudaram os horários das sessões, mudou a lógica de filmes a exibir (lembro-me da exclusividade com que a Millenium soube trazer a Lisboa filmes como “Saraband” ou, mais recentemente, “A Casa Nostra”; “Domino” estreou numa semana e saiu na seguinte; “Control”, que tinha sido exaustivamente anunciado pela Millenium, não mereceu sequer aposta por parte da Lusomundo – aliás, este assunto era suficiente para um post per se, não é admissível que em Lisboa quem queira ver o filme tenha apenas duas salas à disposição)... A Lusomundo não teve tacto suficiente para perceber que o Alvaláxia não é mais um Colombo ou um Vasco da Gama e limitou-se a “adaptar” a fórmula que aplicou nesses dois centros às salas que adquiriu. Pois bem, perderam o meu King Kard. Não há proximidade de casa que compense este tipo de tiros nos pés.

Seguem-se algumas palavras sobre os CDs provenientes do outro lado do Atlântico que fizerem por o merecer, e à medida que houver tempo.

November 17, 2007

Kanye West lançou-se acima da maralha hip hop americana, esse molho de profetas da ostentação, com um olhar crítico e com um mais que justificado desdém pela comunidade. Haviam duas grandes razões que legitimavam a altivez de Kanye: a primeira dava pelo nome de The College Dropout e a segunda por Late Registration. Quem os ouviu sabe, concerteza, que Kanye não era apenas mais um, era o melhor.

No passado mês de Setembro, Graduation chegou às lojas em competição directa com Curtis, de 50 Cent, que resolveu dizer que desistiria da sua carreira musical caso Kanye vendesse mais.
Jogada de marketing ou não, o que é facto é que a disputa resultou, e, no caso de Kanye West, Graduation tem-se mostrado como o seu disco de maior sucesso comercial. Há coisas boas neste Graduation: evita tiques instrumentais normalmente evitáveis nos discos de hip hop, desvia-se do mau hábito de estender a duração do álbum para limites pouco suportáveis, não tem medo do seu lado mais comercial. Funciona. Mas esperava-se mais qualquer coisa, provavelmente sentido de risco. Mesmo com grandes canções como Stronger, The Glory ou Homecoming, falta rasganço à graduação do rapper americano.

November 15, 2007

Como dantes

Os Travis voltaram à estabilidade com um disco pouco surpreendente mas infinitamente melhor que 12 Memories, esse disco maldito onde a banda de Glasgow resolveu afirmar (mal) a sua veia política com canções de um esquerdismo risível – alguém se lembra de Beautiful Occupation?
Este The Boy with No Name mostra aquilo que eles sabem fazer e ponto final. Se querem mais é favor procurar noutro lado.

October 01, 2007

Hora do Bolo

Se algum misantropo estiver, pelo maior dos acasos, a ouvir a Hora do Bolo na Radar este Sábado ficam a saber que é este vosso escriba que está a passar as músicas. Se forem como qualquer cidadão vulgar e aproveitarem o fim de semana para outras coisas (neste momento ocorrem-me umas trezentas e vinte e sete alternativas melhores que ouvir rádio), ficam a saber que perderam uma hora de música a meu gosto.

September 26, 2007

The Get Up Kids - II

Depois da boa recepção que Something to Write Home About conseguiu ter, o passo seguinte dos The Get Up Kids foi o lançamento de Eudora, uma compilação de covers, b-sides e outras músicas suas que tinham tido edição em alguns primeiros e longínquos EP’s lançados em edição própria. Uma forma eficaz de capitalizar o tal “hype” entretanto criado, ainda que lançado como que a ganhar tempo para preparar o sucessor e a aplacar a expectativa criada em seu redor.

O terceiro álbum de originais surgiria pouco depois com a edição de On a Wire, álbum que apresenta uma banda mais adulta e mais concisa na forma de abordar a escrita e construcção musical, ainda que menos fulgurante. Aqui os The Get Up Kids dão o salto, ainda que este possa ter sido numa direcção que não agrade à maioria dos fãs. As guitarras eléctricas “melódico-explosivas” e o ritmo rapidamente oscilante entre o frenético e o contemplativo ficaram de lado, e na sua vez surgem guitarras mais calmas e propícias a baladas, com ritmos condizentes. Um álbum compacto, ainda que recebido com um certo sentimento de desilusão.

Em 2004 era editado aquele que viria a ser o último álbum de estúdio dos The Get Up Kids, Guilt Show e, este sim, demonstra claramente que a sua linha tinha chegado ao fim. As composições são pouco imaginativas, não existe nenhuma faixa que salte claramente aos ouvidos após uma (ou mesmo várias) audição(ões) e chega-se ao fim da duração da obra com uma sensação latente de descrédito em relação a uma banda que tanto tinha sido capaz de produzir, nomeadamente com o fabuloso Something to Write Home About.

Uma última referência para o álbum final da carreira destes rapazes. Um álbum ao vivo, Live! @ The Granada Theater, gravado durante a sua tour de despedida, regista toda a energia que estes punham nos seus concertos e que acaba por contrariar um pouco a acalmia sonora que a sucessão dos seus ábuns apresentam. Nota final também para o “discurso” de despedida que os The Get Up Kids dedicam aos seus fãs, que tem como título uma frase de uma das suas grandes músicas e que acaba por conseguir resumir em quatro palavras bastante daquilo que os orientou enquanto grupo: “Say goodnight, mean goodbye”.

Atenção a “Campfire Kansas” (On a Wire) e à fantástica versão de “Regret” dos New Order (Eudora).

September 13, 2007

Um tigre é sempre um tigre

E eis que num ano de regressos, surge Ryan Adams. Regresso este que tem a particularidade de parecer que sucede a um longo silêncio quando, na verdade, apenas há pouco mais de ano e meio tivemos direito a três (!) álbuns de Ryan Adams, sendo um deles duplo...

Comecemos pela dualidade presente no título: Easy Tiger, como se algum tigre pudesse ser descrito enquanto “easy”, ou como se para acalmar um animal como o tigre bastassem estas palavras... E no entanto não deixa de ser uma excelente metáfora para a obra que Ryan Adams, qual tigre/génio irreverente e incontrolável, desenvolve ao longo das treze faixas aqui presentes.

Em Easy Tiger – que é um álbum bem mais fácil, ainda que isso não implique que seja melhor ou pior, do que o seu predecessor, 29 –, Ryan Adams agrupa e percorre as várias influências que o conjunto dos seus álbuns apresent(ar)am ao longo de uma já profícua carreira. Desde os tempos mais country dos extintos Whistkeytown (“Pearls On A String”) até aos mais calmos Love is Hell (“I Taught Myself How to Grow Old”), desde o primordial Heartbreaker (“These Girls”) ao recente Jacksonville City Nights (“Tears Of Gold”), e passando pelo ovni Rock’n’Roll (“Halloweenhead”), Ryan Adams tudo junta, tudo mescla – e, como dizia Lavoisier, no final nada se perde. Arrisco mesmo acrescentar: tratando-se do senhor que se trata, só se pode ganhar.

Para além deste novo lançamento, Ryan Adams anunciou que ainda este ano irá ser lançada uma box, contendo dois álbuns originais que nunca chegaram a ser editados (provavelmente devido à clarividência ofuscante dos senhores que comandam as editoras), para além de agrupar diversas raridades e b-sides que tiveram direito a edições exclusivas e limitadas. Ou seja: não parece haver motivo para temer uma quebra na produtividade deste enfant terrible do “alt country”. Ele está aqui para durar.

September 10, 2007

Blur refazem-se

Os Blur recuperaram Graham Coxon, o guitarrista geek que os abandonou para se dedicar à sua carreira a solo, e contam com ele já para as gravações do próximo disco. Finalmente, digo eu. Não que não tenha gostado dos Blur sem o seu guitarrista de sempre, ou que veja Coxon a solo como um erro, nada disso. Quer Think Tank (último Blur), quer Love Travels at Illegal Speeds (último Coxon), são álbuns que se impõem na multidão de pé descalço que é o mercado musical britânico. Mas a verdade é que os Blur com Graham Coxon são outros: mais eléctricos, mais fervorosos, mais adolescentes. Bem vindos de volta.

September 06, 2007

The Get Up Kids - I

Os The Get Up Kids foram uma banda com relativa importância nos E.U.A., principalmente na divulgação do género indie/emo pop na segunda metade da década de 90, mas que passou ao lado do mercado europeu – apenas me recordo de apanhar por uma vez o videoclip de “Action and Action”, single de apresentação do seu segundo álbum, no defunto canal Sol Música.


Four Minute Mile, o álbum de estreia dos The Get Up Kids é, como não podia deixar de ser, o álbum mais cru e duro da sua discografia, onde salta à vista a ausência dos teclados que viriam mais tarde a ajudar a demarcar claramente o lado mais pop da banda. No entanto, esta é uma estreia que expõe desde logo as bases em que a banda se viria a apoiar para definir a sua identidade musical: preocupação com a secção rítmica, nunca descurando o duo de guitarras eléctricas, e letras declarada e abertamente centradas nos relacionamentos pessoais e os seus problemas – poder-se-á inclusivamente dizer que distorcem o habitual boy meets girl para um boy loses girl.



Ao segundo longa-duração, o tal que supostamente define uma banda e a sua confirmação (ou não) como fenómeno a seguir, os The Get Up Kids conseguem o seu momento de inspiração suprema. Something To Write Home About é um álbum a que é difícil ficar indiferente, fazendo jus ao nome escolhido – por oposição à habitual expressão inglesa “nothing to write home about”, quando em referência a algo que não entusiasma.

Após o recrutamento de James Dewees (cuja outra banda, Reggie and the Full Effect, é um caso único de banda-paródia com músicas excepcionalmente boas) para acrescentar a secção de teclados à banda, este segundo álbum é aquele que consegue inscrever o grupo na história da música, tal foi a recepção que obteve e o culto que foi capaz de criar. A um som mais límpido e trabalhado em relação ao seu primeiro trabalho, surgiam agora os teclados que transformam ¾ das músicas do álbum em autênticos hinos pop. O hype estava definitivamente criado.

Merecem audição atenta nesta altura “Coming Clean” (Four Minute Mile), “Valentine” (Something to Write Home About), “Ten Minutes” (Something to Write Home About).

September 04, 2007

Mariza outra vez internacional

Mariza, actualmente a fadista viva mais conhecida fora de fronteiras, está nomeada para um Grammy na categoria de Best Folk Album. O disco que lhe deu o bilhete para Las Vegas, onde será realizada a cerimónia, é Concerto em Lisboa.
Uma boa notícia para a música portuguesa muito embora continue a achar que Mariza, com aquela voz, podia ir bem mais longe do que vai. Em três discos de estúdio, nenhum passa da mediania – Pelo Dia Dentro, último registo fadista de Camané, põe qualquer um deles num bolso.

Motéis há muitos

Pequeno aparte: começa esta quarta-feira, e estende-se até domingo, o 1º Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa, o MOTELx. Durante estes dias, o festival toma por casa o São Jorge, cujas bilheteiras são o único ponto de venda dos bilhetes para todas as sessões. Para mais informações e consulta da lista de filmes e respectivos horários: MOTELx.


E um pequeno P.S: estreou na passada quinta-feira o filme Vacancy - Motel. Por estes lados a expectativa é elevada, já que ultimamente a tendência dos filmes de terror parecia ser a do gore, sangue e violência explícita, em vez do susto após boa dose de suspense em antecipação daquilo que se vai passar a seguir. A confirmar se a espera valeu a pena.





E pronto, esta foi uma "Horror Movie Intermission". A música segue dentro de momentos.

September 02, 2007

Fúria de Gales

Em 1991 Gales deu ao mundo uma das bandas mais politizadas da história rock. Esteticamente glam e musicalmente entre o air rock e o punk visceral dos Sex Pistols, os Manic Street Preachers tinham tudo para ser polémicos. Richey James, apesar de não ser vocalista e de a sua perícia na guitarra ser muitas vezes troçada nos bastidores, sobressaía-se como ícone da banda – exímio letrista, instável e desequilibrado, ficou conhecido por se auto-flagelar numa entrevista quando questionavam quão autênticos eram realmente os MSP.
Em 1992 sai o debutante Generation Terrorists e músicas como You Love Us ou Motorcycle Emptyness começam a chegar às rádios. Por trás do inegável tacto em construir grandes canções rock escondem-se letras altamente subversivas. O álbum é um panfleto de retórica esquerdista e um autêntico regicídio na monarquia do Reino Unido – “repeat after me, fuck Queen and country/ repeat after me, death sentence heritage”. Faixa atrás de faixa disparavam contra o establishment, fosse ele o capitalismo, a apatia das massas, as marcas, a publicidade, a religião ou a coroa Britânica. A crítica gostou da ousadia e recebe-o bem. O hype estava criado pressionando os MSP a voltarem atrás na sua promessa de acabarem com a banda a seguir ao primeiro álbum ser lançado.
Seguiu-se Gold Against the Soul, seguimento previsível do primeiro disco, menos inspirado e mais acomodado que o antecessor, mesmo assim mostrando aqui e ali um novo lado dos MSP, mais sinfónico, que seria trabalhado em anos futuros. O que dava que falar, contudo, não era o novo álbum: as fissuras existentes na banda tornaram-se evidentes demais - Richey James estava cada vez mais reduzido ao que sobrava de si próprio, Nicky Wire fazia questão de soltar tiradas inconvenientes dia sim dia não e a banda tocou com apenas três elementos durante grande parte da sua tour (a falta de comparência vinha, claro, da parte de Richey James).
Em 1994 chegou Holy Bible, ainda hoje considerado por muitos como o melhor álbum gravado pelos MSP. Holy Bible carregava todo o desencanto que Generation Terrorists tinha mas extremou-o lírica e musicalmente. Goste-se ou não, foi o álbum bomba dos MSP, as guitarras estavam mais ríspidas que nunca e as letras totalitariamente radicalizadas. É, provavelmente, o disco mais furioso e desacreditado da década de 90. Richey explicou tudo o que sentia por lá: versos como “childhood pictures redeem, clean and so serene/ see myself without ruining lines”, “these sunless afternoons I can’t find myself” ou “he's a boy, you want a girl, so tear off his cock, tie his hair in bunches, fuck him, call him Rita if you want” anunciavam o que estava para vir. A promoção do álbum nos Estados Unidos estava próxima mas antes disso Richey James volta a ser notícia pela última vez. A 1 de Fevereiro de 1995 desaparece, tendo o carro sido encontrado junto a uma ponte perto de Bristol, famosa pelos suicídios que recebe. Pouco tempo depois Richey foi considerado morto, embora o seu corpo nunca tenha sido encontrado. A banda ficou devastada com a notícia e temeu-se o seu fim. Para a grande maioria dos fãs, e possivelmente também para os três restantes membros, os Manics deixariam de ter sentido sem Richey que era visto como a alma e o cérebro do grupo – mesmo tendo em conta a sua limitada capacidade musical, a verdade é que era ele que encabeçava toda a raiva política e social conhecida nos MSP. Sean Moore, o pouco mediático baterista da banda, definiu-o da melhor forma, intitulando-o como o seu ministro da propaganda.
Mas James Dean Bradfield, que de todos os elementos sempre foi o mais músico, assegurou a continuidade do, agora, trio. Poucos meses depois voltaram a reunir-se para compor novos temas. Agarraram em antigas letras de Richey James, juntaram novas de Nicky Wire e James Dean Bradfield encarregou-se de construir canções rock de tom épico. O resultado foi Everything Must Go (não é preciso mencionar a quem é que o título era dirigido), o álbum que pôs os Manic Street Preachers como estrelas internacionais. Além do aplauso da crítica e das vendas astronómicas que teve, Everything Must Go coleccionou prémios pelo mundo fora. Ainda assim, não se livraram de ser acusados de vendidos pelos fãs de primeira hora, ainda revoltados pela perda do seu elemento mais combativo.
E foi a partir deste momento, pós Richey James, que os MSP deram inicio a uma nova fase. É verdade que a veia política está lá e sempre estará, mas estes Manics, os de hoje, estão já muito longe da fúria Marxista de 90. De Everything Must Go (1996) até Send Away The Tigers (2007), os três Galeses envelheceram, amainaram, serenaram e começaram a dar mais importância ao detalhe melódico que à luta política pura e dura. This Is My Truth Tell Me Yours (1998) é paradigmático nesse aspecto: canções calmas, melodiosas e introspectivas, quase caseiras. Mesmo Know Your Enemy (2001), que dos últimos discos é visto como o mais activista, alinha a sua forte posição política com um discurso bem mais leve, ou pelo menos não tão chocante, que as primeiras obras da banda. Ainda houve tempo para prestar uma interessante homenagem aos 80’s dos New Order quando lançaram Lifeblood, em 2004. E agora temos este Send Away The Tigers, acabado de sair, e com um single fresquíssimo de nome Your Love Alone Is Not Enough a dizer-nos que eles estão para durar.

Que durem.


Sean Moore disse que de três em três discos os MSP fazem um álbum de ruptura. Foi assim com Holy Bible, foi assim com Know Your Enemy e, se as contas não me falham, será assim com o próximo.


Que durem até lá, pelo menos.

August 31, 2007

O Verão do campo à cidade


Chegou como habitualmente na altura certa para o seu estilo de som – o Verão – o novo álbum do “vagabundo” norte-americano Josh Rouse.

Sucedendo a Subtítulo (de 2006, e a primeira produção depois de se ter fixado na vizinha Espanha), Country Mouse City House vem demonstrar que afinal de contas a sua carreira não está tão estagnada como se poderia temer após o álbum do ano passado, que trazia um não muito agradável sabor a Josh Rouse em piloto automático.

Aqui podemos voltar a escutar em bom plano a voz quente de Josh Rouse acompanhada em duas faixas pela da sua nova namorada Paz Suay, que parece ter uma influência crescente na vida do cantautor norte-americano: para além do projecto musical de ambos, She’s Spanish, I’m American (criado no início deste ano), co-escreve três das nove músicas do presente álbum.

Em Country Mouse City House Josh Rouse não regressa aos tempos áureos do incomparável 1972 (ainda que “Italian Dry Ice” não desfizesse caso constasse da sua obra-prima), mas assina um registo que consegue seguir o que de bom tinha conseguido por exemplo em Nashville.

Um álbum onde predominam ambiências leves – nem podia ser de outra maneira –, e no qual Josh Rouse consegue explanar a sua música desde o registo mais intimista de London Bridges ao mais jazzy de Hollywood Bass Player passando, como não podia deixar de ser, pelo seu lado mais pop, do qual Nice To Fit In é um fiel exemplo.

Apesar de ser tudo menos uma revolução ou uma obra marcante – e talvez por isso mesmo –, um saudável regresso.

August 28, 2007

Férias

Depois de um interregno de posts de um mês, seguido de outro mês de férias, está na altura de voltar ao activo nos próximos dias, já que álbuns não faltam. Até lá.

July 06, 2007

Ressaca SBSR' 07

Arcade Fire: se acham que os álbuns são bons...

Go see them live!

May 23, 2007

LOGH @ Santiago Alquimista, 11-Mai-07

Uma vez que as últimas duas sextas-feiras foram noites de concerto, resolvi que esta seria uma boa altura para inaugurar a secção de "crónicas" de concertos aqui no Arte del Pop. E porque sobre a vinda dos Bloc Party ao Coliseu já muito se falou por essa blogosfera fora, centro-me no concerto da sexta-feira que a precedeu: os portugueses Katabatic precediam o cantautor Christian Kjellvander, e ambos abriam para o principal nome da noite, os suecos Logh.

É sempre uma boa notícia quando a editora nórdica Bad Taste Records se lembra de incluir Portugal como paragem nas digressões dos grupos com que conta nas suas fileiras, e desta vez voltaram a sair-nos em sorte os Logh, que já contavam com uma presença em Lisboa (e no mesmo palco) em 2003, e dos Last Days of April na Zé Dos Bois aquando da promoção do seu If You Lose It.

Por motivos que se escaparam ao meu controlo no próprio dia – e que com certeza se devem à genética latina do povo português... – acabei por chegar atrasado ao Santiago Alquimista, já os Katabatic estavam em palco. Do pouco que consegui ouvir na altura (apenas uma música completa e o final de outra) deu para me aperceber de um rock atmosférico prometedor e não muito visto em bandas nacionais, ainda que, e na definição de um amigo que se encontrava a vê-los desde o início, “estes malucos toquem sem vocalista”. Mesmo que pouco tenha visto deles, foi o suficiente para me convencer a comprar o CD-EP+DVD que estava à venda na entrada no intervalo entre concertos. Também só custava 4 euros...

Seguiu-se o sueco Christian Kjellvander, ilustre desconhecido para os meus lados. Acompanhado apenas da sua guitarra e de uma jovem desconhecida cantora que o acompanhava nos refrões e dava o ritmo possível – pouco, como pediam as composições de Kjellvander – com uma pandeireta, acabou por demonstrar a sua qualidade e a da sua música, embora tenha acabado por soar um pouco como um peixe fora de água, intermediando o rock dos Katabatic e a pop nórdica dos Logh. Como curiosidade (tanto o título como a história deste) apresentou um tema chamado... “Portugal”.


Chegado ao prato forte, o concerto não desiludiu: os Logh apresentaram-se em palco dispostos a dar um bom concerto e conseguiram-no. Compreensivelmente mais centrado no último álbum North, mas com passagens pelos momentos mais conseguidos de álbuns anteriores (e aqui particular destaque para as fabulosas “The Contractor and the Assassin” “Ghosts”), o espectáculo foi equilibrado e com a fluidez adequada àquilo que o seu trabalho mais recente pedia. A bateria oscilando entre a distante suavidade e a entusiasmante presença marcava o ritmo pelo qual se regiam as programações, o órgão e as inevitáveis guitarra e baixo eléctricos.

Um concerto que serviu fielmente o propósito de promoção do álbum North, de tal modo que acabei por trazê-lo da loja improvisada na entrada do Santiago Alquimista, ainda para mais num belo exemplar em vinil branco. Álbum este que espelha bem a evolução que os Logh tiveram desde o seu início enquanto banda e da sua sonoridade mais pesada e escura, apresentando agora uma pop de cariz calmo e introspectivo, ainda que com uma certa escuridão latente na generalidade dos seus temas – ou não fossem estes seis rapazes provenientes do frio da Suécia.

May 15, 2007

The “Thes”

Não, não pensem que se trata de uma qualquer homenagem à banda que acolheu Johnny Marr depois do fim dos The Smiths. É apenas o reflexo de um curioso regresso à moda das bandas com nomes The Qualquer Coisa. Em repeat durante o horário de trabalho nos últimos dias, e quebrando um pouco aquilo que ambicionava para o Arte del Pop (uma vez que não possuo "música em formato físico" para nenhuma destas bandas, apenas mp3), recomenda-se:


The Teenagers (MySpace, e já com referência na "bíblia" da casa...)


The Cinematics (MySpace, e com referência aquando da terceira edição da Salada Mista Sem Tomate do não menos "profeta" Pedro Gonçalves...)


The Rifles (MySpace).


E para já é só.

April 27, 2007

I(n)di(e)oma

Volto a afastar-me do propósito principal do que por aqui escrevemos. E, no entanto, nem tanto assim...

Explicando (título inclusive): passou durante esta semana, no festival de cinema independente IndieLisboa, a experiência cinematográfica dos Daft Punk, Electroma. Nele tomamos contacto com as duas formas robot dos Daft Punk, na sua viagem – ao mesmo tempo que trip – para se tornarem humanos.


Este filme acaba por ser uma prova de resistência para os espectadores: os robots mantêm-se naturalmente mudos durante todo o filme, a banda sonora que o acompanha não é da autoria dos Daft Punk nem contém aquilo que se esperaria de um filme deste duo, mas antes desde música clássica a Brian Eno, passando por Todd Rundgren e outros...

Muito se poderia analisar neste inclassificável objecto, desde as metáforas sobre a tentativa de humanização do que não o é até às atitudes dos dois “heróis-robot” após tudo o que passam, passando pelas reacções (no fundo tão humanas) que a comunidade robot tem perante o que lhe é diferente, e no entanto ficaria sempre muito por referir. Um filme híbrido, estranhamente cativante e merecedor de maior atenção e admiração. No fundo, um projecto à imagem dos seus mentores.

April 23, 2007

Confúcio e outras coisas mais

Apenas uma pequena relíquia para ilustrar o post...



Depois da mudança de sexo do/a Blitz, seguida do desaparecimento do excelente UM e dos recentes issues com o próprio nome que o suplemento do Público Y / Ípsilon teve, o que é que ficava a faltar? Que acontecesse alguma coisa ao 6ª, do DN. Faltava mas deixou de faltar há 2 semanas atrás, com o fim do suplemento graças à nova direcção do jornal.

May you live in interesting times, diz-nos a tradução inglesa de um famoso provérbio chinês. Mas estes não são tempos assim no que diz respeito à análise, crítica ou simples escrita musical (pelo menos no formato “tradicional”). Especialmente se os compararmos com a ebulição que se fazia sentir (ou vamos, que pelo menos eu sentia) com, por exemplo, o Blitz dos 90’s.

A corrida para o ir buscar quando saía, ler sobre o que é que se escrevia naquela semana, ver a troca de “galhardetes” em que os leitores normalmente transformavam o espaço que lhes estava reservado, tornando-se assim parte integrante da força viva que era o jornal... Em suma, interesting times – mesmo descontando qualquer distorção nostálgica que possa advir de escrever sobre memórias juvenis. Nada que se possa dizer quando se olha para o panorama do jornalismo musical actual, se assim lhe podemos chamar.

Mas descansemos e não nos preocupemos: ficamos a saber, através de um comunicado da nova direcção do DN, imposta pelo grupo que o detém, que ao fim do 6ª não equivale o fim dos seus conteúdos, já que estes irão ser “distribuídos pelo jornal nos restantes dias”... Yeah, right.

No entanto, se há algo de verdadeiramente bom que esta era de massificação e globalização da informação nos trouxe é a oportunidade que temos, todos os que o desejarem, de ler o que nos têm a dizer Pedro Gonçalves ou Jorge Manuel Lopes, só para dar um exemplo do que está disponível por essa blogosfera fora. É preciso saber procurar, e onde procurar, mas as oportunidades estão lá, e qualquer um (tanto de um “lado” como do outro, se olharmos para isto com uma visão economicista de oferta e procura) pode ter a bonança de a encontrar. Como, por exemplo, aconteceu com este fellow blogger...

May you live in interesting times. Mas cada vez mais cabe-nos a nós mesmos fazer por isso.

April 19, 2007

Capas há muitas - III

No último ano da década de 70's surgem dois álbuns cujo lançamento se deu inclusive no mesmo mês, e cujas capas conseguem retratar (cada uma à sua maneira) o esvaziamento e a desilusão do pós-punk e desses anos onde qualquer futuro parecia sombrio e desinteressante para a juventude de então. Ambos são álbuns de estreia de bandas que marcaram a história da música moderna, influenciando e desbravando caminhos que ora pareciam divergentes, ora paralelos e conseguem por vezes apresentar pontos de contacto.



Three Imaginary Boys, dos The Cure, apresenta-nos o início do génio pop, na altura com muitos laivos punk, de Robert Smith. Com uma sonoridade mais crua do que a que viriam a apresentar numa fase posterior da sua carreira (nomeadamente a partir de The Head On The Door), mas que surge como característica principal ao longo dos seus quatro primeiros álbuns, este primeiro longa-duração apresenta-nos uma capa onde o título aparece “traduzido” na imagem: os tais três rapazes imaginários (os membros da banda?) surgem como… um candeeiro, um frigorífico e um aspirador, sobressaindo de uma parede de fundo e um chão tristemente cor-de-rosa – parece uma contradição quando escrito, mas depois de vista a fotografia não o é tanto assim. A home life, e o porquê de ser tão desesperante para toda uma geração, sem necessitar de explicações.


Surgia em Machester, ao mesmo tempo, uma banda que teria uma importância no desenvolvimento da música moderna como a conhecemos inversamente proporcional ao seu tempo de vida. O primeiro álbum da Joy Division, Unknown Pleasures, é um álbum pesado, por vezes soturno e asfixiante, coroado pela sua bateria mecanizada, o baixo “melódico-depressivo” e a voz lúgubre de Ian Curtis. Uma obra assim dificilmente poderia ter uma capa que melhor se lhe adaptasse, e da autoria de alguém que não necessita de apresentações – o inigualável artista gráfico Peter Saville. Tanto a música da Joy Division como as capas dos seus trabalhos serviram de inspiração para muitos que se seguiram na febre pós-punk, quais figuras inspiradoras para a criação de outros. Hipnotizante.

March 28, 2007

Capas há muitas - II

Indeciso sobre qual a ordem lógica a seguir pelo resto do texto que tinha imaginado, acabei por me decidir pelo critério temporal, escrevendo sobre os grupos / artistas e analisando o seu exemplo de capa escolhido por décadas. Começo, como não podia deixar de ser, pelas mais antigas, com exemplos repartidos entre a década de 60’s e a dos 70’s – e qual deles o melhor...


A primeira capa que me merece referência é a de Pet Sounds, dos Beach Boys. Álbum mítico e marcante da década de 60’s, é este trabalho que afirma definitivamente o grupo como um dos mais geniais do seu tempo – e de sempre. A fotografia da capa demonstra claramente um cuidado do grupo em adequar a capa ao álbum e respectivo título: nela aparecem os cinco Beach Boys em calma comunhão com um grupo de cabras que os rodeia, e que estes entretêm fazendo-lhes festas e dando-lhes comida. Haverá melhor declaração de intenções da “mentalidade Peace & Love” que os Beach Boys tão bem representam? Tudo sem uma única palavra.


Em 1971, cinco anos depois de Pet Sounds, aparece-nos mais uma iconográfica capa – num duplo sentido, já que para além da capa em si, o álbum que a apresenta em muito contribuiu para a afirmação de quem lá aparece enquanto ícone da música soul americana. What’s Going On, soberbo disco de Marvin Gaye, com uma simples fotografia do mesmo em plano central (e por isso mesmo em destaque), de perfil e fitando algo ao longe, algo que não vislumbramos e que por isso mesmo fica para a imaginação de cada um. Sobretudo de cabedal, com gigantescas golas levantas e uma atitude cool inerente ao próprio Marvin Gaye – ou a soul retratada numa foto.

March 27, 2007

Capas há muitas - I

Mais uma vez me desvio do “âmbito” (se é que se pode dizer que existe um âmbito específico aqui no Arte Del Pop) para escrever um post, que será distribuído por capítulos devido a questões logísticas, um pouco em jeito de homenagem a um blog temático verdadeiramente fora-de-série que infelizmente apenas descobri já no fim do seu tempo de vida. O link (também) está ali ao lado – é o Capas de Culto, obviamente.

Do meu ponto de vista pessoal, a capa do disco desempenha um papel relevante na minha opção de comprar ou não um disco quando o tenho na mão – isto porque quando estou a comprar discos acabo invariavelmente por ficar com uma pilha deles, distribuídos entre a lista permanente dos que me faltam, raridades que encontro, até curiosidades que me aparecem à frente sem estar à espera.

Ora, numa época em que a música se descobre maioritariamente pela internet – ou seja, música em formato digital, ao contrário do que fazemos questão de abordar por aqui – a questão da capa e da arte que representa acaba por ficar relegada para um plano secundário, e esse é um aspecto que tenho dificuldade em aceitar, até porque não raras vezes acabei por descobrir excelentes bandas apenas porque a capa de algum dos seus discos me chamou a atenção nos escaparates de uma qualquer loja de música e me decidi a arriscar comprá-lo com o “conhecimento” exclusivo do gosto do grupo... na elaboração da capa.

Seguem-se alguns exemplos de bandas que primam pelo cuidado (e gosto) que apresentam na selecção da capa das suas obras, cada um com uma imagem de alguma delas. Para já fica apenas a que me inspirou a escrever estas linhas, e cujo álbum me merecerá um post “normal” num futuro próximo:


Arcade Fire: Neon Bible.

March 22, 2007

Guess who's back

Damon Albarn faz questão de aparecer frequentemente a dizer que está vivo. Vem com os Blur quando lhe dá para o lado Inglês, com os Gorillaz quando se lembra do lado Americano e agora fez novos amigos para o acompanharem numa experiência quase conceptual - o que vale é que todos o perdoamos por gostarmos tanto dele.

Agora vai de convencer o baixista Paul “The Clash” Simonon, um tal de Tony Allen, baterista de escola jazz, e Simon Tong, ex-membro dos sobrevalorizados Verve. A soma destes homens dá pelo nome de The Good, the Bad and the Queen embora Damon Albarn insista que a banda não tem verdadeiramente um nome e que este é apenas o título do álbum. Ou seja, Damon tem tanto projecto na cabeça que nem tem tempo para lhes arranjar um nome próprio - o que vale é que todos o perdoamos por gostarmos tanto dele.

As canções começam e acabam em Londres, ela está em todo o disco, basta ouvir “a ship across the estuary, Sunday’s lost, in melancholy / a storm of strings far away” para percebermos que a pintam de preto e branco, nebulosa como sempre e como epicentro do apocalipse (quem duvide que atente à capa e a versos como “Friday night in the kingdom of doom, ravens fly across the moon” ou mais explicitamente “the medicine man is here twenty four seven, you can get it fast in the Armageddon” – e não, não estamos a falar da mesma música). A luz lá vai entrando a conta-gotas à medida que nos aproximamos do fim até que na última faixa, precisamente The Good, the Bad and the Queen podemos escutar a bonança: “the sun came out of the clouds and charged up the satellites, we all got our energy back and started walking again”. O disco é bom, não tão bom como o melhor que Albarn já fez - mas o que vale é que todos o perdoamos por gostarmos tanto dele.

March 16, 2007

A grande verdade

Os álbuns de Armando Teixeira, como Balla ou Bulllet, começam sempre bem: ruídos expectantes, batida forte, sintetizadores cortantes, e sem dar-mos por isso estamos a ondular o pescoço e a batucar com o pé. A Grande Mentira, o novo de Balla, não é excepção. Saltei de Mim e O Fim da Luta são quase perfeitas. Mas, a partir daí, o disco acomoda-se (embora a acomodação de Armando Teixeira nunca desça abaixo de um certo nível) e perde quando comparado, por exemplo, ao primeiro registo homónimo.
Aos dois minutos de disco ele lá avisa: “vou abusar do teu corpo” – por vezes consegue-o (nas supracitadas e, mais lá para a frente, em Olá John Di Fool), mas a dita frase aplicar-se-ia melhor se a encaixássemos noutro álbum seu.

March 12, 2007

A importância da (boa) rádio


Menção agora para um dos melhores álbuns que comprei o ano passado apesar das dificuldades que tive em descobri-lo neste rectângulo à beira-mar plantado, tendo inclusivé sido necessária uma ida a Madrid para o conseguir encontrar...

Os The Radio Dept. são (como não podia deixar de ser, apesar de isto começar a ser um bocadinho repetitivo) provenientes da Suécia. Tema e tempo para uma pequena reflexão: não sabendo ao certo o que se anda a passar por terras escandinavas, alguma coisa terá de ser, uma vez que os grupos de qualidade continuam a surgir que nem cogumelos por aquelas bandas.

Pet Grief é o seu segundo longa-duração, e apresenta-nos um som onde o sintetizador predomina tanto ao nível melódico como rítmico, isto apesar do grupo apresentar guitarras e baixo (não muito) eléctricos a par de uma (calma) bateria. As referências mais próximas acabam por ser os Pet Shop Boys ou os My Bloody Valentine, embora me pareça que os Last Days Of April da última fase também não desfaçam numa afinidade a uma temática e a um ambiente claramente próximos do shoegazing.

O álbum abre de uma forma que nos amarra a atenção por completo e nos deixa sedentos pelo que se segue, e que dificilmente poderia ser melhor: "It's Personal", ou os Sigur Rós em versão electrónica sem que com isso percam uma tranquila embora comovedora acutilância, seguida da faixa que dá nome ao álbum, ou a melhor canção dos anos 80 escrita em pleno século XXI - dançante, desprendida embora com a sua quota parte sombria, plena. Seguem-se depois disso mais dez faixas, entre as quais duas pequenas divagações instrumentais, e nas quais podemos encontrar pérolas como "I Wanted You To Feel The Same" (onde mais uma vez nos lembramos de Sigur Rós), ou as finais "Tell" e "Always a Relief". Até as que não destaco pela música em si, sem que isso signifique que desmereçam ou que as descarte de alguma maneira, justificam o destaque pelo título - caso, por exemplo, de "The Worst Taste In Music".

Os seus (curtos) 37 minutos terminam sem que evitem deixar-nos um leve sabor a pouco, mas no bom sentido: uma vontade que o álbum não terminasse ali, que continuasse e nos desse mais momentos de rara beleza como os que até ali contém.

March 03, 2007

Right on


Este vai ser o post mais curto da história do Arte Del Pop, de tão fácil que é falar sobre este álbum. Está tudo brilhantemente resumido numa música presente neste Yours Truly, Angry Mob, o novo dos Kaiser Chiefs: "Everything is average nowadays". Na mouche.

February 28, 2007

O fim-de-semana é o melhor da semana


Ponto prévio: não se espere que A Weekend in the City seja um segundo Silent Alarm, nem que tenha a força, urgência ou excelência do álbum de estreia dos Bloc Party. As estreias são por definição irrepetíveis, e nestas coisas as expectativas costumam ser más conselheiras.

O ano agora é 2007 e os Bloc Party procuram caracterizar ao longo do álbum o ambiente que se vive actualmente em Londres, com a forte presença de imigrantes convivendo lado a lado com uma certa tendência isolacionista tipicamente britânica, a par das grandes mudanças que testemunharam no curto espaço de 2 anos em consequência dos atentados de 7 de Julho de 2005, ou ainda criticando a cultura de desprendimento cool que a geração mais jovem parece seguir sem pensar nas consequências ou no futuro. A propósito desta descrição vem-me à cabeça um magnífico post de um blog que não lhe fica atrás e cuja leitura aconselho vivamente.

Não é por acaso que A Weekend in the City começa com "Song for Clay (Disappear Here)", uma clara referência ao romance "Less Than Zero" de Bret Easton Ellis, no qual se relata o regresso de Clay à sua cidade-natal de L.A., os devaneios e aventuras em que aí participa numa espiral descendente de decadência, sexo e drogas até que decide, já no final do livro, partir (ficando no ar a hipótese dessa partida ser definitiva) desiludido com a cidade e com as pessoas que a habitam, sejam seus amigos ou não. Os Bloc Party procuram aqui traçar o paralelismo dessa L.A. suja e amoral para a Londres na qual habitam e da qual conhecem o lado mais escuro.

Os dois (tumultuosos) anos que separaram os seus álbuns foram aproveitados para o crescimento, amadurecimento e experimentação de novas orquestrações para o seu estilo, sendo isso mesmo notório neste A Weekend in the City. Ouvem-se violinos, batidas mais electrónicas e sintéticas (para além da visceral bateria), coros, sintetizadores. Nota-se essencialmente uma maior rede de complexidade à volta da construção de cada faixa, faltando depois, no entanto, a capacidade de capitalizar totalmente essa maior preocupação com a arquitectura sonora. E, não significando este facto a passagem do álbum para a categoria de álbum menor, não deixa de ser pena.

Esclareçamos: há aqui excelentes músicas e que contêm tudo o que os Bloc Party são capazes de fazer melhor: a já referida faixa inaugural, "Hunting for Witches" que não desfaria se fizesse parte do anterior Silent Alarm, a crítica à subcultura feita religião de "Uniform", ou as mais 'fáceis' "I Still Remember" e "Sunday". Estas músicas são no entanto alternadas com momentos menos conseguidos, como "Where is Home?" ou "SRXT", o que quebra a unidade do álbum e provoca a sensação de que com um maior cuidado na escolha do alinhamento do álbum poderia estar aqui um fora-de-série.

Ainda assim, este álbum não desmerece os Bloc Party e não deixa de ser um dos bons álbuns deste ano até ao momento.

February 22, 2007

Uma questão de letras






O Público mudou de imagem recentemente, o que permitiu ao mercado de leitores de jornais passar a ter a possibilidade de escolha entre dois Diários de Notícias e zero Públicos. A mudança visa aumentar a quota de mercado, claro, mas sobre ofertas versus interesses do público em geral já João Lopes se debruçou num excelente post, ainda que partindo de dados sobre outros meios de comunicação.

Não era, no entanto, sobre o jornal Público no geral que eu queria falar, até porque este é um espaço no qual os seus editores – e visitantes – procuram visar sobretudo a música. O objecto de estudo deste post prende-se antes apenas com o “novo” suplemento do “novo” Público: o velho Y acabou e deu lugar ao “novo”... Ípsilon.

Se esta “mudança” de título fosse a única, ou ainda que fosse acompanhada por uma alteração no grafismo (mesmo que para pior – como efectivamente foi), “no pasaria nada”. No entanto, o novo formato do Ípsilon espelha de forma altamente eficaz a maneira como o problema abordado no post de João Lopes tem sido tratado por quem “oferece” ‘Arte e Cultura’: desrespeitando quem a “procura” e não tendo pejo em aglutinar tudo o que o seja num imenso amontoado de resumos, enquanto oposto de análise crítica.

Temos então o suplemento Y, que procurava, aquando da sua génese, abordar a música, o cinema e o teatro de uma forma crítica mas fundamentada e cuidada, transmorfado num “novo” Ípsilon que agrega o antigo Y, o não menos importante antigo suplemento literário Mil Folhas (entretanto extinto) e aos quais ainda acrescenta uns restos de Arquitectura e Design. Basicamente, a ‘Arte e Cultura’ é tratada como um bolo ao qual não é reconhecido uma importância relevante na sua generalidade, quanto mais a cada uma das suas “fatias” individuais, e para o qual a atenção a dispensar se pode agrupar num suplemento único oferecido à sexta-feira.

No caso específico da música, e olhando exclusivamente para a página que nos traz as reviews dos álbuns da semana em questão, temos agora um agrupamento de todos eles numa página única com cinco ou seis colunas (uma arrumação a fazer lembrar o melhor da crítica musical da Maxmen ou da FHM), tendo sido também abandonado o sistema dos números de 0 a 10 para abraçar o sistema das estrelas – e essa aberração que são as meias-estrelas.

Já não bastava “a nova” Blitz, junte-se este “novo” Ípsilon ao fim do UM... O que é que sobra? Talvez apenas a crua constatação de João Lopes acerca dos números da Marktest sobre o interesse do público na ‘Arte e Cultura’: “não se pode procurar – nem encontrar – o que não está lá.”.

February 04, 2007

Whatever happened to the 80's?


Confesso que foi um pouco o hype criado por estes senhores que me levou a ficar curioso e a ganhar vontade de descobrir este álbum. Afinal não é todos os dias que uma banda decide responder a uma canção-pergunta com mais de 20 anos...

Após várias audições deste Rattlesnakes ainda tenho dificuldades em encontrar adjectivos que consigam descrever fidedigna e adequadamente o álbum. Não acredito na perfeição, ainda para mais em algo tão díspar e abrangente como a pop, mas é a palavra que mais me vem à cabeça à medida que o disco vai girando, mais ainda se nos lembrarmos que se trata de um álbum de estreia – gosto particularmente de álbuns de estreia, onde normalmente não existem restrições à criatividade nem expectativas a cumprir em relação à sonoridade. É esse desprendimento que confere muitas vezes ao início de muitas bandas / projectos de qualidade uma aura especial que depois tarda em repetir-se.

A excelência pop (“Perfect Skin”, “Rattlesnakes”) encontra-se aqui num estado quase puro, sendo intercalada aqui e ali com alguma folk (“Four Flights Up”, “Down On Mission Street”) e até com ligeiras influências de jazz do bom (“Speedboat”), tudo isto magistralmente misturado e interpretado por uns The Commotions que apresentavam no seu frontman Lloyd Cole uma voz hipnotizante, cativante, um poeta-espírito-livre mordaz, com sentido de crítica / humor verdadeiramente “witty” e altamente cult(ivad)o – referências a Arthur Lee (dos lendários Love), Truman Capote ou Grace Kelly nas suas letras – , capaz de usar tudo isto para criar aquela aura (que ainda hoje apresenta) de génio que, precisamente por o ser, está condenado a não compreender e a não se integrar no mundo onde vive, acabando por ser igualmente incompreendido por este.

Um álbum seminal da pop produzida em 80’s com apenas um apontamento a fazer, não a Lloyd Cole ou aos The Commotions, mas antes à editora: haveria melhor maneira de terminar o álbum do que com a extasiante “Are You Ready To Be Heartbroken?” ? Para quê adulterar o álbum original enquanto obra adicionando-lhe 4 faixas extra? Não está aqui em causa o valor do “lixo” de Lloyd Cole (faria a obra-prima de muitos...) que são estas 4 músicas, mas convenhamos que por alguma razão os autores optaram por deixar o álbum com 10 faixas na sua versão original. Ignorar isso é desvirtuá-lo.

January 23, 2007

Os três da vida airada



Musicalmente falando, dificilmente haverá hoje em dia país mais entusiasmante do que a Suécia. Os valores seguros aí existentes englobam nomes como The Knife, Shout Out Louds, Logh, The Sounds, The Concretes, Last Days Of April, Love Is All, The Radio Dept. (se tudo correr bem, alvo de uma referência futura por aqui), aos quais se juntam estes Peter Bjorn and John, trio composto por... John, Bjorn e Peter.

Writer’s Block, assim é o nome deste bom terceiro longa-duração (depois de um primeiro álbum homónimo e de um segundo, Falling Out, que desconheço) que consegue fazer transparecer ao longo dos seus 45 minutos uma consistência que tem tanto de notável como de incomum. A pop aqui criada é construída de forma quase antagónica à simplicidade com a qual costuma atingir o seu expoente máximo: para além dos tradicionais bateria, baixo e guitarra, nota-se a presença de piano, harmónica, bongos, órgão e sintetizador, até samples (vade retro!) de "shh’s", "whoo’s" e sons variados do dia a dia, acabando toda esta mescla por funcionar de forma superior.

Ligações a bandas conterrâneas são inevitáveis – tal como “Up Against the Wall” faz lembrar as fases mais recentes dos Last Days Of April, também “Let’s Call It Off” não desfaria se incluído no álbum de Shout Out Louds. No entanto, existem ao longo do álbum traços muito próprios que fazem por estabelecer desde logo uma identidade própria aos Peter Bjorn and John, e que são particularmente notórios nos dois momentos de excelência aqui presentes: em “Young Folks”, excelente single de avanço com o seu ritmo jingante, proveniente em partes iguais do assobio de Bjorn e de toda a parte de percussão, para além do “diálogo” entre Peter e a frágil perseverança da voz de Victoria Bergsman (antiga vocalista dos The Concretes); e em “The Chills”, onde o “shh shh shh” serve de ponto de partida para uma bateria tudo menos óbvia (mas que não impele menos ao leve abanar do corpo por isso) e à sua perfeita conjugação com uma potente linha de baixo e uma cativante melodia sintetizada.

Mais uma banda que conseguiu a minha atenção e que vale a pena seguir, depois de um disco que tem tanto de seguro como de prometedor, coisa rara nos dias que correm – ao que parece, excepto na Suécia.

January 18, 2007

Natal de Michigan

Continuo sem perceber onde é que Sufjan Stevens vai buscar tempo para tanta coisa. Assim que, há uns anos, li que este workaholic tinha como objectivo lançar um álbum por cada Estado americano soltei um sorriso desdenhoso: a ideia parecia-me entusiasmante, mas impraticável – além de tirar todo o tempo de vida ao rapaz. Ora, Sufjan depois de editar Greetings from Michigan (2003) – o seu primeiro Estado a ser visitado – já lançou Seven Swans, Illinoise (o segundo Estado), The Avalanche e agora uma caixa de cinco (!) cd’s desta vez abordando o tema do Natal. Isto enquanto procede a exaustivas pesquisas da história e alma de cada região americana.
Verdadeiramente impressionante em tudo isto é que Sufjan ainda não deu um passo em falso.
Este Songs for Christmas, embora não traga nenhuma novidade maior na carreira do compositor, continua a ser um conjunto de discos belíssimos, ideal para esta altura do ano, e embrulhado como se de um presente de natal se tratasse: com letras, acordes, autocolantes, poster e textos escritos pelo próprio. Inclui versões dos grandes clássicos natalícios e mais uns inéditos a juntar à já extensa obra do americano, tudo isto devidamente separado anualmente. A boa música nunca vem fora de tempo e neste caso, recorrendo ao cliché, Natal é todos os dias.

January 08, 2007

¡Avante camarada, avante!



Depois de ouvir bem este Give Me A Wall, o cancelamento (no próprio dia, e sem direito a explicações ou razões para tal) do concerto dos ¡Forward Russia! no Santiago Alquimista no passado mês de Setembro torna-se ainda mais lamentável...

O álbum de estreia deste quarteto britânico que alberga uma rapariga - eterno fétiche pessoal (allo allo Sonic Youth, Pixies, The Smashing Pumpkins, ...) - apresenta construções elaboradas ao colar diferentes ritmos e riffs de forma algo abrupta mas conseguida (allo allo dinâmica start-stop), que contribuem sobremaneira para um resultado final poderoso, tanto ao nível individual de cada faixa "per se" como ao nível aglutinador do álbum enquanto um todo.

A sonoridade do álbum em geral é bastante próxima da apresentada pelos genialmente criativos e igualmente extravagantes At The Drive-In na fase final da sua vida (culminada com um extraordinário último álbum, Relationship Of Command) - vide em particular "Seventeen" ou a faixa de abertura "Thirteen", onde se destacam os agudos atingidos pela voz de Tom Woodhead e a melodia conseguida pelo baixo num plano oposto ao da "conversa" de guitarras que se lhe sobrepõe - , embora alguns loops electrónicos pisquem aqui e ali o olho aos Muse, como em "Nineteen", e se note em "Eighteen" uma semelhança (que pouco ou nada terá de inocente) com os Bloc Party, nomeadamente ao nível da construção entre as guitarras, o ritmo irrequieto proveniente da bateria feminina e alguns elementos melódicos electrónicos, acompanhados por uma urgência (própria - e única - da juventude) presente na voz à la Kele Okereke.

Como resultado final fica um álbum equilibrado, com os décibéis puxados para cima mas usados com sabedoria q.b. , da estreia de uma banda a seguir (até para confirmar se a qualidade presenciada provém de meras colagens oportunas ou lhes é intrínseca), que tem ainda como particularidade o facto de todas as faixas terem como nome nada mais nada menos que... números.

January 03, 2007

And now for something (a little bit) different...

Para primeiro post do novo ano, um post ligeiramente diferente: análises mais curtas e abordando dois álbuns no mesmo post, álbuns esses que dificilmente entram de caras nalgum dos muitos sub-géneros da pop, mas que ainda assim fazem o suficiente por merecer o seu espaço aqui (e nas prateleiras do meu quarto).


Os Deftones dão, neste Saturday Night Wrist, o passo que se deveria ter seguido à obra-prima White Pony, depois da indefinição de rumo apresentada no álbum homónimo que se lhe seguiu e do (sofrível) álbum pelo meio de Team Sleep, o projecto paralelo do vocalista do grupo. Voltamos a ter boas construcções electrónicas a acompanhar as (pesadas) guitarras, num resultado final equilibrado e pontuado pela inconfundível voz de Chino Moreno. Quem for fã da habitual sonoridade dos Deftones não vai dispensar "Beware" ou "Kimdracula", enquanto quem tiver por hábito desconfiar destes norte-americanos vai ser surpreendido pela electrónica pura da colaboração com Annie Hardy em "Pink Cellphone" ou pelo excelente instrumental Nintendiano "U, U, D, D, L, R, L, R, A, B, Select, Start" - quem não percebeu incorre no crime de nunca ter tido um Game Boy ou uma NES...



Em Pratica(mente), Sam The Kid atinge a simbiose quasi-perfeita entre o seu génio criativo de beats e samples, já apresentada no ímpar Beats Vol. 1 - Amor, e a sua parte de rapper declamador de poesia por excelência ("enquanto a maioria faz versos", segundo o próprio), dotado de um flow aperfeiçoado e único, facilmente identificador da sua presença na música. A este equilíbrio entre sons e voz, Samuel Mira junta ainda uma capacidade de crítica que tem tanto de mordaz como certeira (ouça-se o single de avanço do álbum "Poetas de Karaoke"), convidados e colaborações de qualidade a rodos, incluindo registos de spoken word do seu pai na figura do (igualmente poeta) pseudónimo Viriato Ventura, e uma faceta de contador de histórias tanto verdadeiras, como em "Slides (Referências)", como ficcionais, caso do excelente "16/12/95". Conforme se ouve Rui Veloso brincar num sample no final de "Juventude (é mentalidade)", este disco apresenta-nos "Sam The Man: He's not the Kid, he's the Man!".